Silêncio por favor

É o que me irrita no final da noite,
a cerveja se foi,
a memória se foi,
os amigos se foram,
o amor se foi,
mas o álcool continua aqui,
de longe ela vem,
toca meu rosto,
a obra de arte que é o silêncio,
meu doce,
meu vinho,
minha tarde ensolarada,
o silencio,
o mendigo de pés encardidos,
que me aborda nas noites,
apenas pedindo um favor,
mantê-lo vivo,
sempre temos algumas moedas em nossos bolsos,
sempre temos poesia.

Um bar qualquer em São Carlos

Era uma noite úmida,
as luzes refletiam-se no asfalto,
quatro,
cinco,
seis cervejas,
sozinho,
caminhando sem destino,
passava por casas e casas,
vejo pessoas sentadas em bancos de plástico,
elas esperam por algo,
noite pós noite,
um gato passa ao meu lado,
crianças jogando jogos em seus quartos,
era uma primavera manchada,
pelos rastros de putas e mendigos nas ruas,
e a rua mesmo sem voz gritava por socorro,
implorava por um dia sem sujeira,
grande merda,
jogo injusto,
sem conversa.

Vejo um bar aberto,
rostos tristes,
bêbados,
entre eles,
doutores,
engenheiros,
vendedores,
vagabundos,
e um poeta,
o dinheiro escorrega de minhas mãos,
sete garrafas,
nenhum vinho barato,
apenas cerveja,
um homem chora pela sua mulher,
dois começam a discutir,
o balcão molhado pelas garrafas,
aquilo os entregava,
havia muito álcool naquela conversa,
meus olhos se fecham,
alguém me empurra,
um corte no braço,
isso nunca significou algo para um suicida,
e lá estava,
eu,
como as putas e os mendigos,
drogados e traficantes,
manchando as ruas com cerveja e sangue,
sangue e cerveja…
E o que é a vida,
se não um corpo fraco e embriagado  sangrando em uma sarjeta?
As cortinas se fecham…
Abrem espaço para um breve silêncio…
Aplausos.